“Ninguém pode exigir minha renúncia”, afirmou o presidente do Senado, José Sarney. Uma convicção fortalecida pelo conselho do seu guru, o pai-de-santo Bita do Barão: – “Continue no teu lugarzinho e banque o duro. Tu tens o corpo fechado”. Sarney com corpo fechado? Não seria o Senado? Creio que a palavra mais apropriada é corporativismo! Ou seja, “daqui não saímos e daqui ninguém nos tira”. Por isto a urgência da reforma política.
O problema é que a referida reforma depende dos próprios parlamentares. Pois para acabar com a falta de mobilidade dos eleitores diante desta troca de interesses entre os políticos, existe a idéia do “recall” – expressão para uma proposta de reforma que consiste em oferecer mecanismos de mobilização popular para cassar os parlamentares que desonram seu mandato.
Infelizmente a nossa política sempre foi uma estrada livre de vantagens inescrupulosas – para si e para os parentes e achegados. E se a desonestidade aumenta junto com a ganância, é fácil compreender toda a corrupção. Uma situação vergonhosa que começa na administração dos próprios municípios e estados. Acredito que um bom jeito para minimizar esta cultura da farra do dinheiro público seria instituir a vereança voluntária – o ensino fundamental que prepara para o ensino médio (Estado) e superior (Brasília).
No entanto, em tudo é preciso viver “a” mordomia, e não “na” mordomia. A Bíblia recomenda: “Sejam bons mordomos dos diferentes dons que receberam de Deus. Que cada um use o seu próprio dom para o bem dos outros” (1 Pedro 4.10). A palavra “mordomia” no original no Novo Testamento é oikonomos – que literalmente significa “a lei da casa”. Na vida cristã isto lembra que todas as coisas vêm de Deus. E com um propósito: “para o bem dos outros”. A força e o exemplo surgem do Filho de Deus que disse: Eu não vim para ser servido mas para servir e dar a vida para salvar muita gente (Mateus 20.28).
Evidentemente que cristianismo é uma coisa e política é outra. Mas os dois têm o mesmo caráter funcional: receber e repassar. “Para o bem de todos, Deus dá a cada um alguma prova da presença do Espírito Santo” (1 Coríntios 12.7), lembra o apóstolo sobre os diversos dons que o cristão desempenha dentro e fora da igreja. E se este cristão é um servidor na vida política, é uma bela oportunidade para “viver de acordo com o Evangelho de Cristo” (Filipenses 1.27). Lembro que “viver” aqui, no original grego. é politeuesthe, e a tradução adequada seria: “Viver politicamente correto neste mundo de acordo com o evangelho de Cristo”.
Mas a Constituição brasileira, no artigo 37, avisa crentes e descrentes indistintamente sobre a mordomia: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência”. Sarney tem razão, ninguém pode exigir que um mau político renuncie. Ele deve ser afastado. Portanto, que venha logo a reforma.
Marcos Schmidt
Jornal NH de 13 de agosto de 2009
Jornal NH de 13 de agosto de 2009