“Olhei para todos os lados, mas não vi Deus”, disse Yuri Gagarin no primeiro voo espacial tripulado há 50 anos. Naquele 12 de abril, a agência oficial de notícias da União Soviética transmitia: “Gagarin voltou da sua ascensão e a todos felicitou. Pois ele não procura um paraíso nos céus porque não esqueceu que é na terra que o homem o paraíso merece”. Sete anos depois, o astronauta caiu com o seu Mig ao desviar de uma nuvem e perder o controle do avião. Mereceu o paraíso na terra por breve tempo.
Nesta quinta-feira a Bíblia lembra que Jesus ascendeu ao céu e desapareceu numa nuvem para que os terráqueos pudessem merecer o paraíso. Desceu e subiu com a mesma missão. “Confiem em Deus e confiem também em mim. Na casa do meu Pai há muitos quartos, e eu vou preparar um lugar para vocês” (João 14), disse o Senhor ao defender o plano de voo. No entanto, há um perigo aqui, algo parecido com o caso daqueles discípulos deslumbrados na visão. Por isto o recado: “Por que estão olhando para o céu?” (Atos 1.11).
Nem tanto ao céu nem tanto à terra. Nestes dois mil anos este tem sido o desafio dos seguidores de Jesus. E a Ascensão do Senhor tem esta mensagem sinalizadora, tanto para a conduta contemplativa, enclausurada, fora da realidade terrena, e, noutra direção, para a vida grudada em coisas, obstinada na promessa da prosperidade material. A história do Deus que foi mas não foi, que subiu mas ficou, que desapareceu mas está em todos os lugares, lembra que “ninguém pode amar a Deus, a quem não vê, se não amar o seu irmão, a quem vê” (1 João 4.20). Por isto a oração do Salvador: “Pai, não peço que os tires do mundo, mas que os guardes do Maligno (...) para que o amor que tens por mim esteja neles” (João 17.15,26). Sem este amor, ninguém jamais verá Deus e nem o paraíso. Poderá até olhar para todos os lados, mas enquanto estiver nas alturas, em corridas espaciais e terrenas, só enxergará a si mesmo.
Marcos Schmidt
Jornal NH de 2 de junho, 2011