“Já podeis, da Pátria filhos, ver contente a mãe gentil...”. A maioria não sabe cantar o resto, o que não significa falta de patriotismo. Pode ser uma questão cultural. Ou porque é complicado mesmo, assim como o próprio Hino Nacional e os demais – todos com um vocabulário tipo “os grilhões que nos forjava da perfídia astuto ardil”. Penso, no entanto, que estes hinos são a cara da política brasileira, muito interessante na partitura, no papel, mas longe do entendimento popular. A gente até sabe assobiar a melodia, mas na hora de cantar, se enrola nas palavras, se confunde na memória, se perde no sentido. Por exemplo: Quem foi o meu candidato na última eleição? Qual o trabalho do Vereador? O que faz uma Câmara Municipal? Quais os compromissos do Prefeito? Para onde vai todo o dinheiro arrecadado nos impostos?
Ninguém duvida que a democracia é saudável, é bonita, igual aos hinos nacionais. Mas por nojo à corrupção, o perigo é suspirar pela canção chata da ditadura. Ao contrário, a forma popular de governo é a orquestra com uma sinfonia da liberdade, com a batuta dos direitos e deveres sem distinção, do maestro que é o próprio povo. Mas aí que começa o fenômeno do hino difícil. Porque fugimos dos ensaios, cochilamos na platéia. Incorporamos o espírito patriótico só nas Olimpíadas, na Copa do Mundo. Lembramos dos nossos representantes políticos só na euforia das campanhas. Ou na apatia. Depois os esquecemos. E pior, eles se esquecem de nós. E como diz aquela propaganda, são quatro anos sapateando. E eles nos enrolando.
Um problema que acontece também na igreja. O cristão, eleito para os propósitos de Deus (1 Pedro 1.2), cidadão dos céus (Filipenses 3.20), que recebeu de Cristo a independência da morte (1 Coríntios 15.57), pode facilmente se enredar na desafinada canção “deixa a vida me levar, vida leva eu”. Pode tapar os ouvidos ao aviso: Não vivam com vivem as pessoas do mundo, mas deixem que Deus os transforme (Romanos 12.2). Uma acomodação melódica, tradicional, distante do verdadeiro culto, do oferecer-se completamente a Deus num sacrifício vivo (Romanos 12.1). Por isto o recado: Não se enganem; não sejam apenas ouvintes dessa mensagem, mas ponham em prática o que ela manda. Porque aquele que ouve a mensagem e não a pratica é como um homem que olha no espelho e vê como ele é. Dá uma olhada, depois vai embora e logo se esquece de sua aparência (Tiago 1.22-24).
“Os grilhões que nos forjava da perfídia astuto ardil, houve mão mais poderosa, zombou deles o Brasil”. Alguém entendeu? Melhor buscar o dicionário para descobrir que é isto que fazem muitos políticos, e é disto que precisamos nos libertar: “A desleal sabedoria do jeitinho que nos moldava nas prisões, tem agora uma mão mais forte”. Esta mão é o entendimento, seja na política ou na religião. Ou como diz o texto sagrado: “Então não seremos mais como crianças, arrastados pelas ondas e empurrados por qualquer vento de ensinamentos de pessoas falsas” (Efésios 4.14).
Marcos Schmidt
Jornal NH de 4 de setembro de 2008